Direito marítimo, cadeia produtiva e o futuro da globalização

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Na década de 1960, o pesquisador e intelectual Marshall McLuhan apresentou um conceito chamado Aldeia Global. Em sua concepção, o desenvolvimento tecnológico acelerado iriam, num futuro próximo, encurtar distâncias, suprimir limitações geográficas, ampliar drasticamente o progresso global e, ao mesmo tempo, transformar a realidade de todo o planeta para um formato semelhante ao que ocorre em uma pequena aldeia: um mundo no qual todos estariam interligados, de uma maneira ou de outra.

Poucas décadas depois essa previsão confirmou-se como acertada, com o surgimento e ascensão da Internet, seguida pela democratização de dispositivos eletrônicos móveis. Se aplicado hoje, o conceito de Aldeia Global não se limita apenas ao âmbito da comunicação. Na economia, na política, na cultura e em praticamente todos os aspectos possíveis, uma sociedade globalizada é, também, uma sociedade interdependente.

Este fenômeno traz consigo vantagens inimagináveis, mas também desafios que se estendem até mesmo a áreas como logística global, transporte aquaviário e direito marítimo e portuário, temas deste artigo.

Por que o direito marítimo e portuário é uma área estratégica?

O direito marítimo, uma das áreas de atuação do escritório Tostes & De Paula, é o segmento do direito que regula as relações oriundas da movimentação de carga e pessoas em meio aquaviário, bem como as relações decorrentes da utilização dos portos (direito portuário e direito do trabalhador portuário) e aduanas (direito aduaneiro).

Sua importância está diretamente relacionada ao papel do modal aquaviário na economia global. O gráfico abaixo representa o volume de transporte do comércio marítimo de 1990 a 2020, comprovando a importância e o crescimento constante do modal. Salvo em raras exceções, associadas a momentos de crise global (crise financeira de 2008 e pandemia de Covid-19 em 2020), o volume esteve sempre em ascensão.

Além disso, episódios recentes como o caso do navio Ever Given no Canal de Suez, em 2021, evidenciaram alguns dos desafios do mundo globalizado que, de certo modo, se conectam com áreas estratégicas como indústria naval, infraestrutura marítima, tecnologia da informação e direito marítimo e portuário, todas importantes para a busca por soluções que contribuam para o desenvolvimento e pleno funcionamento da cadeia produtiva global.

Canal de Suez, caso Ever Given e os desafios de um mundo globalizado

Em março de 2021, o mundo foi pego de surpresa por um episódio incomum e problemático. Não bastasse os efeitos devastadores da pandemia de Covid-19 na economia global, um navio porta-contêineres encalhou no Canal de Suez, no Egito. O problema estava no fato de que essa via navegável artificial é uma das rotas marítimas mais usadas do planeta.

Foi assim que, por alguns dias, um verdadeiro congestionamento de embarcações se formou, ascendendo sinais de alerta nas bolsas de valores globais devido aos impactos do atraso generalizado na entrega de mercadorias e matérias-primas gerado pelo incidente. Mais que isso, o ocorrido trouxe à tona novos debates sobre as implicações de uma economia global ultra conectada, na medida em que um navio encalhado no Egito literalmente afetou indústrias de diversos segmentos em praticamente todos os países.

Se, por um lado, o livre comércio e as interações proporcionadas pela tecnologia e por um sistema global de produção conectado trouxe amplo desenvolvimento e benefícios consideráveis; por outro, há o receio de que essa dependência extrema possa ser uma causadora de problemas cada vez mais graves e complexos.

Na medida em que é virtualmente impossível que um país se desenvolva atualmente sem estabelecer parcerias internacionais estratégicas, as nações também se tornam suscetíveis a sofrerem os impactos de problemas e crises indiretas. Da teoria do caos para o mundo dos negócios, o efeito borboleta comprova-se como uma metáfora verdadeira, visto que, atualmente, o simples bater de asas de uma borboleta pode ocasionar um tornado no outro lado do mundo.

O papel do direito marítimo na cadeia de produção do futuro

O que fica evidente diante de casos como o do navio Ever Given e de outros acidentes, conflitos e decisões de impacto internacional, é que os mercados globais nunca estiveram em um cenário de tamanha interdependência quanto atualmente. Praticamente qualquer interferência significativa em processos estratégicos, seja no âmbito político, econômico, social ou logístico, por exemplo, eventualmente pode impactar toda a cadeia de produção global.

Este é um fenômeno que não deve retroceder. Pelo contrário, com o avanço e democratização da tecnologia em todas as indústrias, a tendência é que essa interconectividade seja cada vez mais abrangente. Além disso, na medida em que países historicamente subdesenvolvidos ampliam suas economias e investem em infraestrutura, bens de consumo e afins; e as grandes potências globais se esforçam para manterem-se no topo, as relações internacionais políticas e econômicas serão marcadas por novas conexões e um comércio global no qual fatores como produtividade e eficiência tornam-se mais e mais importantes. Em alguns anos, episódios como o do navio Ever Given podem significar um caos ainda maior, caso se repitam.

Neste sentido, portanto, o papel do direito marítimo destaca-se pela importância que o modal aquaviário continua desempenhando na economia mundial. Mesmo com o desenvolvimento de meios de transporte disruptivos para passageiros e cargas, como trens-bala e drones, por exemplo, não há indícios de um substituto à altura dos navios cargueiros para transporte de grandes quantidades de mercadorias. Somado a isso, o setor marítimo e portuário é marcado por inovações e melhorias contínuas.

Justamente por isso, é crucial que o desenvolvimento e a revisão de regulamentações referentes ao direito marítimo e portuário acompanhem o ritmo das mudanças tecnológicas e a crescente importância da movimentação de cargas e pessoas em meio aquaviário, sempre prezando pela segurança, qualidade dos processos, idoneidade nas relações corporativas e pela sustentabilidade em todas as etapas da cadeia de produção.

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